MONSTROS RESPLANDECENTES: O ESPAÇO FANTÁSTICO E A (DES)CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE EM UMA CASA NA ESCURIDÃO (2002), DE JOSÉ LUÍS PEIXOTO
Partindo do romance Uma casa na Escuridão (2002), de José Luís Peixoto, este trabalho almeja delinear algumas linhas de reflexão sobre as mudanças que o ataque às torres gémeas do World Trade Center produziram na sociedade/identidade portuguesas.Através da criação de um universo fantástico, no qual se movimentam lado a lado os debilitados habitantes da casa e os “bárbaros” soldados invasores, o romance de Peixoto permite-nos uma abordagem que articula fenomenologia, crítica cultural e crítica literária, dando-nos desta forma acesso a várias camadas hermenêuticas da mudança societal que se opera na passagem de uma sociedade disciplinar para uma sociedade de controlo (Deleuze) dominada pelo medo, até ao modo como o trauma do 11 de Setembro de 2001 se relaciona com uma já traumática identidade portuguesa, herdada do regime salazarista. De modo a articular com maior clareza as referidas camadas da obra, procurarei, num primeiro momento, analisar alguns aspectos a nível formal, nomeadamente, questões de linguagem e a justificação do género fantástico nesta obra; num segundo momento, o enfoque recairá sobretudo sobre a problemática da memória cultural/histórica e os mecanismos através dos quais esta enforma uma matriz identitária portuguesa, a qual, por permanecer agrilhoada ao passado (saudade), outra coisa não vê que escuridão no seu presente (Eduardo Lourenço).