Dossiê do Seminário (Re)discussão sobre as grandes áreas do conhecimento IEA-USP / NAP-CIPEM

Foram realizados três encontros, na Sala Alfredo Bosi do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (IEA-USP). Coordenados pelo Prof. Dr. Rubens Russomanno Ricciardi, os debates adotaram um formato livre, em que todos aqueles que estavam presentes ou que acompanhavam de forma remota puderam dar opiniões e fazer perguntas. Nesse sentido, procurou-se promover a liberdade do debate, sem qualquer rigidez. Ressalta-se que os textos que compõem este dossiê estão em sua forma transcrita e concisa, a partir da gravação dos encontros. Em sua finalização, foram retirados os excessos da oralidade e as passagens pro forma. Também foram feitos ajustes no tocante aos recursos coesivos e normativos da língua portuguesa, mantendo-se o teor das argumentações, sem interferir no tom original.

O que as mãos não ousam tocar: Revisão crítica das “premissas musicais” do livro Feitiço Decente de Carlos Sandroni.

Este trabalho propõe uma análise crítica de conceitos e ideias presente no livro de Carlos Sandroni: Feitiço Decente de 2001, sobretudo do capítulo intitulado premissas musicais. A partir de uma postura política procura-se aprofundar a discussão sobre certos equívocos metodológicos na forma como o autor utiliza conceitos musicais, especialmente rítmicos, presentes na música popular brasileira e de matriz africana: como a síncope, as claves e linhas guias, e as métricas aditivas e divisivas. Através da revisão de certa bibliografia, é possível observar autores que se aproximam das visões de Sandroni sobre o tema, e deixam transparecer o caráter ideológico por trás de tal postura analitica: como a supervalorização da percepção individual; do apelo às diferenças e à alteridade; e a recusa em usar o ferramental analitico tradicional nas pesquisas sobre a música popular e de matriz africana. O que se pretende demonstrar é como algumas premissas ideológicas de uma certa musicologia ‘nova’ podem turvar e limitar a visão sobre expressões musicais não hegemônicas.

Radamés Gnattali e a guitarra elétrica:

Radamés Gnattali foi um dos compositores brasileiros mais comprometidos com a música popular urbana brasileira e com o jazz estadunidense (BARBOSA e DEVOS, 1984). Em sua música de concerto, empregou diversos elementos musicais, instrumentos e padrões performáticos advindos desses campos da criação musical. Neste artigo, trago uma análise harmônica e instrumental dos momentos em que esse compositor utilizou a guitarra elétrica como um instrumento solista do Concerto Carioca nº1, fato inédito na música de concerto. Procuro demonstrar que Gnattali não estava em busca de um instrumento com maior volume sonoro, embora essa característica possa ser utilizada pontualmente, mas buscava um novo timbre instrumental, empregando um instrumento elétrico recentemente criado à época da escrita dessa obra. O emprego da guitarra elétrica, instrumento fortemente vinculado ao jazz, perfaz uma importante demonstração do compromisso que Gnattali estabeleceu com a música popular urbana.

Adeus, Pirandello e a Grosse Fuge - Aproximações entre o romance de Marco Lucchesi e a op. 133 de Ludwig van Beethoven

O escritor Marco Lucchesi, em seu romance Adeus, Pirandello, realiza, ao longo de sua intrincada e multifária narrativa, com fortes matizes autobiográficos, uma série de menções pungentes e simbólicas ao compositor Ludwig van Beethoven e sua obra – em especial, à sua tardia op. 133, também chamada de Grosse Fuge (Grande Fuga). Esta composição, principalmente nos momentos finais do livro, contribui para a consolidação de um ambiente narrativo já tenso e polifônico, sinuoso e eivado de angústia desde os primeiros capítulos. O presente texto pretende apontar a presença de linhas comuns entre a estrutura narrativa do romance de Marco Lucchesi e a poética da Grande Fuga, ambas, “obras de invenção”, sob a perspectiva de uma correspondência sígnica e estrutural. Palavras-chave: Marco Lucchesi; Ludwig van Beethoven; Adeus, Pirandello; Grosse Fuge; romance; fuga; crítica literária.

(Re) discussão sobre as grandes áreas do conhecimento: crítica à epistemologia fundamental – ruminações

As áreas do conhecimento, tal como estão estruturadas nos sistemas de avaliação da ciência, no Brasil, são objeto de discussão de tempos em tempos, tanto pela comunidade científica, quanto pelas próprias agências de fomento – CNPq e CAPES. O artigo formula questões debatidas em seminário realizado no IEA/USP, em 2018, e tem por objetivo problematizar alguns aspectos pertinentes ao fazer científico, sobretudo no que se refere às Humanidades, foco de ameaças de grupos que negam ou desconhecem a importância histórica e social desses domínios do conhecimento que incluem, entre outros, os campos de estudos e pesquisas da literatura, da filosofia, da música, da história.

A aula de música on-line no ensino superior: considerações emergenciais sobre pedagogia e motivação em tempos de pandemia

O presente artigo apresenta algumas considerações sobre pedagogia e motivação nas aulas de música no Ensino Superior, abordando atividades realizadas nos anos letivos de 2020 e 2021, período correspondente à pandemia do Covid 19. Para tal, comentamos os termos relacionados à pedagogia e à motivação e descrevemos atividades aplicadas e vivenciadas nas aulas, que ilustram esta prática em interações emergenciais on-line .

Os benefícios do ensino musical na formação e desenvolvimento humano

O texto em questão tem como objetivo demonstrar em que medida a música, enquanto área de conhecimento, pode contribuir na formação e no desenvolvimento integral dos indivíduos e quais as zonas do corpo físico e psíquico que podem ser acionadas no contato com a música. A fundamentação teórica está embasada nos textos de Maria Cândida Moraes (2003), A. Storr (2002), S Viellard e E. Bigan (2005), entre outros, na maioria, pesquisadores focados na cognição musical.

O pecador - para sagrada comunhão

Como parte integrante e inerente à atividade musicológica, a recuperação e reconstituição de manuscritos é aquela que desperta grande fascínio ao pesquisador, fomentado pelo descobrimento de diversas perspectivas históricas e divulgação de um passado muitas vezes esquecido. Tendo isso em vista, nos voltamos para reconstituição e edição de um manuscrito do compositor Florêncio José Ferreira Coutinho – compositor em diversas irmandades atuando concomitantemente com atividade militar provinda do Regimento dos Dragões no último quartel do século XVIII e início do século XIX em Vila Rica, atual Ouro Preto (Estado de Minas Gerais) – pertencente ao acervo de partituras do Museu da Inconfidência no Anexo III – Casa do Pilar, denominado O pecador - Para Sagrada Comunhão. Em suma, neste recorte, pretendemos, por meio de uma metodologia exploratória e procedimento documental, remontar todo o processo de reconstituição do manuscrito, desde nosso primeiro contato com o documento até sua editoração e análise, pontuando as decisões musicológicas que enfrentamos até sua conclusão.

Meneleu Campos - Os Quartetos de Cordas

O presente artigo aborda os quartetos de cordas de Octavio Meneleu Campos (1872-1927), obras do repertório camerístico brasileiro: Quarteto nº 1 em Sol maior (1899), Quarteto nº 2 em Lá maior (1899), Quarteto nº 3 em Ré maior (1901) e Quarteto nº 4 em Mi maior (1902). Na metodologia temos as diversas fontes primárias fornecidas pelo Museu da Universidade Federal do Pará, realizamos uma edição crítica que está em estágio de editoração, bem como uma busca nos periódicos de época sobre a trajetória do compositor e seu repertório, especialmente os quartetos de cordas. Evidenciamos a maestria do compositor na confecção dos quartetos e a importância de sua inclusão no repertório camerístico brasileiro. Discutimos ainda os problemas na recepção de sua obra.