Em fins do século XVI, William Shakespeare escreveu, além de outros textosdramáticos, três comédias que giram em torno da inebriante e complicada experiênciade se estar apaixonado – Much ado about nothing (1598), As you like it (1599-1600) e Twelfth Night (1601). Nas três, personagens femininas ocupam papel de destaque e se tornam a força motriz da trama, superando desafios. Em 2006, a Editora Objetiva publicou o romance A décima segunda noite, do escritor, cronista, cartunista, tradutor, roteirista e dramaturgo Luís Fernando Verissimo (1936-), uma releitura bem humorada da comédia shakespeariana, Twelfth Night or What you Will. O novo texto confirma a relevância das personagens femininas da comédia inglesa e possibilita que o leitor se divirta com as identidades trocadas por meio dos disfarces de gênero. Este quinto romance do escritor gaúcho é o segundo da coleção ‘Devorando Shakespeare’, que pretendia publicar recriações do dramaturgo inglês. Aqui, num movimento de convergência de duas de suas paixões – a capital francesa e a produção do dramaturgo inglês – o escritor gaúcho desloca o lócus dramático da Ilíria balcânica, para a Paris dos anos 70, lócus onde se constrói o híbrido, onde se cruzam os lugares realmente vividos por diferentes sujeitos oriundos dediversos estratos sociais que se unem através do sentimento de solidariedade de grupo, próprio da condição do exílio. De maneira sensível e inteligente, o romancista insere em seu texto um narrador particular: o papagaio Henri, que constrói sua narrativa a partir do poleiro onde o colocam, no salão de cabelereiros Ilíria, de propriedade de Orsino.