Um encontro Saussure-Bakhtin na episteme

RESUMO Neste artigo, pretendemos partir de certas releituras que se têm feito a respeito do construto saussuriano sobre o objeto língua, tomando por base principalmente a noção relacional de sistema, o valor linguístico, para, então, criar possibilidades de diálogo com a perspectiva axiológica de língua presente em Mikhail Bakhtin. Tal perspectiva, neste autor, ganha corpo na conceituação de heterodiscurso e de gêneros do discurso, em que este objeto deve ser compreendido em relações de ordem social e histórica. Além disso, na elaboração linguístico-textual de um gênero, os enunciados operam em relação uns com os outros, a fim de aproximar e/ou confrontar diferentes vozes sociais e ideológicas. Enfim, partindo dessa episteme, que enxerga a língua e os efeitos que dela decorrem como objeto constitutivamente relacional, acreditamos ser possível um encontro entre os dois autores a fim de se ressignificarem formas de interpretar o mundo por meio da ciência da língua(gem).

Face to Facelessness: Imagined Intimacies and Socially Distant Desires

This paper revisits a performance titled Falling in Love Again - and Again which was first performed in 2014 as part of a series of works I created questioning relational intimacy and proximity in public space. During Falling in Love Again - and Again participants were invited to explore public space with the intention of anonymously falling in love with strangers. The details of these encounters were shared with me as the leader of the piece via mobile phone text messages, but never with the subjects of the participants' desires.  Understanding the dynamics of intimacy and proximity in 2014 was a very different experience to how I understand them in 2021. The Covid-19 pandemic, social distancing, and two periods of lockdown has drastically influenced how relationality and physically being in the world with others is performed.  This paper is concerned both with the intimate and proximate dynamics of relational bodies during that performance as I understood it then, and, as a consequence, how we might understand relational proximity and intimacy now.Critical points of departure for the paper include art historian Grant Kester's writing on conversational art practices and his framing of dialogic encounters through the use of Jeffrey T. Nealon's Alterity Politics: Ethics and Performative Subjectivity (1998).  Models of 'dialogical' experience and 'responsibility', as situated by Mikhail Bakhtin and Emmanuel Levinas respectively (Nealon, 1998, cited in Kester, 2004, 118) are used in this article to frame a rethinking of the dynamics and ethics of face to face contact and physical proximity, as bodies in space maintain distance from one another, connected only by our digital devices and our imaginations.  The voyeuristic practices of Sophie Calle and Vito Acconci converge with theatre makers Forced Entertainment's 'writing over' of place (Kaye, 2000) to explore imaginary relational connectivity.  The writing of geographer Doreen Massey supports this framing through the use of Massey's thoughts on the fictional poetics of social interactions and 'stories so far' (Massey, 2005).  Ultimately the paper asks what happens when we are required to imagine being with others in physically distant and imaginary ways with only our mobile devices as depositories for our fictional desires. 

Delírios e deleites: leitura dos diálogos de Machado de Assis com John Milton em Memórias póstumas de Brás Cubas / Deliriums and Delights: the reading of the dialogues of Machado de Assis with John Milton in Posthumous Memoirs of Bras Cubas

Resumo: Os textos de Machado de Assis e principalmente seus romances estabelecem muitos diálogos com diferentes escritores e tradições. Entretanto, a forma que Machado de Assis escolheu para se referir ao poeta inglês do século XVII, John Milton, no seu romance, Memórias póstumas de Brás Cubas, merece uma atenção cuidadosa. Nesse romance, o autor brasileiro também se refere a Milton, mas não de maneira direta ou nomeada; ao contrário, as alusões a Milton são indiretas, criando uma composição textual com o poeta inglês e o convidando, de maneira ausente, a também fazer parte da narrativa. Machado de Assis, na elaboração dos delírios e deleites de Brás Cubas, reflete sobre seu ato de composição e estabelece diálogos também com o poeta inglês, como uma tentativa de proliferar sentidos da obra de Milton, mais especificamente Paradise Lost, no contexto literário brasileiro. Esses diálogos serão analisados com base na ideia de dialogismo de Mikhail Bakhtin (1973, p. 39) que é constitutivo da intertextualidade e desvia o foco das noções de autoria, causalidade e finalidade, e o “texto passa a ser visto como uma absorção de e uma resposta a um outro texto”. Assim, é pertinente dizer que Machado de Assis absorve elementos de composição do universo miltoniano e responde a eles nas Memórias póstumas de Brás Cubas, revivendo, em sua criação literária, suas experiências como leitor desse poeta inglês.Palavras-chave: Machado de Assis; Brás Cubas; dialogue; Milton.Abstract: The texts of Machado de Assis and mainly his novels established many dialogues with different writers and traditions. However, the way Machado de Assis chose to refer to the English poet of the seventeenth century, John Milton, on his Posthumous Memoirs of Brás Cubas, demands a careful observation. In this novel, the Brazilian writer refers to Milton but not in a direct manner; on the contrary, the allusions to Milton are indirect, creating a textual composition within the English poet and inviting him, in an absent way, to be also part of the narrative. It seems that Machado de Assis, in the elaboration of Brás Cubas’s deliriums and delights, reflects upon his act of composition and establishes a textual dialogue with the English poet, as an attempt to proliferate the meanings of Milton’s oeuvre, more specifically Paradise Lost, in the Brazilian literary context. These dialogues will be analyzed based on Mikhail Bakhtin’s studies on the idea of dialogism, which is a constituent of the concept of intertextuality and deviates the focus on the notions of authorship, causality and finality, with writing working “as a reading of the anterior literary corpus and the text as an absorption of and reply to another text” (1973, p. 39). Thus, it is possible to say that Machado de Assis absorbs some elements of composition from Milton’s creative universe and answers him on his Posthumous Memoirs of Brás Cubas, reviving them in his literary creation and in his experiences as a reader of the English poet.Keywords: Machado de Assis; Brás Cubas; dialogue; Milton.

On the Relation between Memory and Language from a Cultural-historical Perspective in Neurolinguistics

In this essay, we reflect about the relationship between memory and language, conceiving both as complex functional systems, developed along the human history and strongly influenced by culture. We give special emphasis to the mediating role of signs, mainly based on the (neuro)psychological principles postulated by Vygotsky and Luria, but also in dialogue with several authors from the fields of Linguistics, Philosophy of Language and Semiotics, among which Mikhail Bakhtin, Aleida Assmann, Augusto Ponzio and Susan Petrilli. Two data are presented in order to contribute to our reflection – the first is extracted of a dialogical episode with a subject diagnosed with Alzheimer’s disease and the second episode with an aphasic individual. In sum, we argue that the cultural-historical approach may provide a better understanding of the interdependent and constitutive nature of the relationship between language and memory. Key-words: Memory, Language, Historical-Cultural perspective, Neurolinguistics, Semiotics

O eu e sua dualidade: uma releitura de O Duplo, de Dostoiévski

O artigo pretende elaborar uma releitura da novela O duplo (1846/2013), do escritor russo Fiódor M. Dostoiévski (1821-1881), tendo como foco a temática da duplicidade como um desdobramento do eu, segundo a visão psicanalítica freudiana, além de abordar o aspecto da estrutura da obra e a questão do dialogismo, na concepção de Mikhail Bakhtin (1997).

construção da imagem de Jesus por meio de seus gestos no Evangelho conforme Marcos

Neste ensaio propomos a compreensão de uma sugestão da construção da imagem de Jesus, personagem principal do Evangelho conforme Marcos, que se dá a partir das escassas narrativas de seus gestos registrados pelo evangelista, compreendido como narrador implícito. A postura de leitura da Bíblia como literatura que aqui se realiza combina a proposta hermenêutica de José Severino Croatto, estudos do discurso de Mikhail Bakhtin, a crítica estilística de Erich Auerbach, a proposta de antropologia filosófica de Christoph Wulf e os estudos de religião de Morton Smith. É conveniente dizer que o conceito imagem aqui é tomado como uma abstração subjetiva e o conceito de gesto é tomado a partir de uma determinada reflexão antropológica. O resultado a que se chega pode ser apontado através dos complexos retratos de Jesus, como o do homem que ama os necessitados, o rabi e o mago. Essas imagens não são contraditórias, mas foram recebidas de formas diferentes pela tradição cristã.

Monologue and Organization Studies

In this essay, we propose that recent work in management and organization studies is typically inclined to understand organization and organizing as dialogic in form. Dialogicity is characterized by dynamic interlocution on the part of active human sense-makers and, in our critical reading, evokes a romanticized social landscape that fails to reflect the more prosaic features of organizational life. To address what we see as certain limitations of the dialogic view, we introduce a complementary point of reference: that of monologic organization. This perspective provokes reflection on those situations in which meanings are predetermined at the outset and communication consists of the strictly controlled, routine reproduction of formal scripts. We draw on the works of Mikhail Bakhtin and Michel Serres to reclaim monologic as a pertinent view of organization and its processes. Finally, we provide micro, meso and macro level examples to illustrate and discuss the heuristic potential of a monologic view.

CRUZAMENTO DE LÍNGUAS: A VISÃO DE AUTORES REFERENCIAIS

Este artigo visa a investigar a literatura sobre o cruzamento de línguas, com o propósito de compreender a maneira pela qual as línguas exercem influência umas sobre as outras. Com esse objetivo, foram selecionadas obras de três autores referenciais no estudo da linguística, Hermann Paul, Edward Sapir e Mikhail Bakhtin. A partir da revisão dessa literatura foi possível constatar que a influência ocorre normalmente por meio da importação de vocábulos e muito mais raramente na forma de alterações fonéticas ou estruturais. Também foi possível dentificar fatores que estabelecem a profundidade e extensão dessa influência, relacionados a características intrínsecas dos próprios vocábulos e das línguas envolvidas no processo de cruzamento, bem como a aspectos culturais, políticos, econômicos e tecnológicos relativos aos povos falantes dessas línguas.

[Meta]polifonia em Cântico das Crianças Corrompidas

Mikhail Bakhtin, no início do século XX, apropria-se de terminologias musicais para elaborar uma visão analítica dos romances do escritor russo Fiodor Dostoiévski. Dessa perspectiva ele cunha o termo romance polifônico. Este artigo procura trazer para o estudo musical as reflexões de Bakhtin sobre a noção de polifonia. Esse novo olhar sobre a polifonia é denominado aqui como [meta]polifonia. Características dessa [meta]polifonia são observadas na obra eletroacústica Cântico das crianças corrompidas.

Postmodern/Post-mortem Human Body-Parts: Grotesque Subjects in The Melancholy of Anatomy

This paper critiques the literary representation of the human body as a “clean” slate, an organically wholesome subject by delving into the postmodern body-writing of Shelley Jackson’s short story collection The Melancholy of Anatomy (2002). Building upon the idea of “metabody” or grotesque body-part as subjects, the flesh-characters, namely Egg, Sperm, Foetus, Cancer, Nerve, Phlegm, Blood, Milk and Fat, breaks apart from their marginality, and evolves in a rhizomatic structure, pressing their possibilities of manifold existence in a fantastical world. Through the lens of body studies critics (Mikhail Bakhtin and Elisabeth Grosz) and recent postmodern scholarship, the paper studies the performance of flesh-characters, creating a post-mortem pathology in literature. Jackson’s deviant approach re-maps the anatomy of the human body and engages in psychophysiological parodies, thereby disclosing social phobias pertaining to the repulsive sides of the human and feminine body. Metabodies are self-reflexive, postmodern grotesque, with micro-narratives; and their innovative representations give agency and consciousness to the usually discarded body-parts and fluids, thereby making the human body a non-normative and discursive text and context.