A pandemia de Covid-19 trouxe-nos um contexto de exceção. Restrições impostas à sociedade foram aplicadas por governos de diferentes partes do mundo, gerando dificuldades, por exemplo, de escolha entre ter privacidade de dados ou saúde prometida por vigilância biométrica (HARARI, 2020). Como “resposta” à disseminação de fake news – não só sobre a doença, mas também sobre outros temas – as agências de fact-checking (PANGRAZIO, 2018; SPINELLI, SANTOS, 2018) surgem com o objetivo de verificá-las, classificando-as em “verdadeiras” ou “falsas”, segundo gradação. Quando publicam a checagem realizada, as agências utilizam manchetes que desmentem as notícias. Entre os padrões linguísticos observados, a negação é bastante frequente nas manchetes verificadas em mídias sociais. Por ser um índice de implícito, está presente no enunciado para produzir sentido: a memória discursiva é, pois, um modo de compreender o estatuto dos implícitos (ACHARD, 1999; PÊCHEUX, 1999). Logo, partimos da hipótese de que a prática de estruturar a negação, nas manchetes analisadas, pode fazer emergir questões interlocutivas via evocação de certa memória discursiva. Com base em pressupostos teórico-metodológicos dos estudos de letramentos (New Literacy Studies) e da Análise do discurso francesa, este trabalho objetivou analisar o papel da memória discursiva em 68 manchetes, publicadas em março de 2020 por duas agências (“Chequeado” e “Agência Lupa), as quais desmentem notícias sobre Covid-19 em mídias sociais. Os resultados obtidos permitiram identificar três estruturas de negação frequentes nas manchetes e parecem confirmar a hipótese de partida, contribuindo com os estudos de letramentos, quanto à formação do leitor em tempos de pandemia.